Autor(a): Carmen Laforet
Editora: Alfaguara
ISBN: 9788560281169
Nº Páginas: 263
Sinopse
Andrea é uma jovem solitária que, logo depois da Guerra Civil Espanhola, muda-se para Barcelona para morar na casa da avó e cursar a faculdade de letras. Ela chega à cidade cheia de expectativas, mas a realidade a assusta logo no primeiro dia, ao travar contato com a família. Na faculdade, ela tem poucos conhecidos e vive num clima de falsas aparências, em que Ena, sua única amiga, esconde suas verdadeiras intenções e os jovens artistas, pretensamente rebeldes, vivem na sombra de seus pais, homens poderosos e reacionários. Em meio a escândalos e intrigas, Andrea terá de aprender a viver e, quem sabe, encontrar a felicidade.
Eu
encontrei esse livro em um sebo. Em meio a tantas histórias a serem lidas,
naquele dia em particular, sentia-me determinado a comprar algo que não se
adequasse à categoria "clássicos" em minha mente. E, após cerca de
dez ou quinze minutos fuçando as prateleiras do lugar, encontrei o título que,
de imediato, fez com que eu pensasse: esse pode ser o livro da minha vida
– coisa que pareceu provável quando li o comentário de Carlos Ruiz Zafón acerca
do livro. Talvez essa seja uma posição difícil de ser alcançada. Talvez Nada,
de Carmen Laforet, não tenha alcançado esse cargo – não neste momento em
particular de minha vida. Entretanto, isso não tira todo o mérito da autora ao
escrever sobre tudo aquilo que nos cerca em momentos de solidão: nada.
A trama é
focada na jovem Andrea, uma moça que chega à cidade de Barcelona com o intuito
de estudar em sua faculdade de letras. Para que possa completar sua graduação, ela
terá que morar na casa de alguns parentes com quem já não se comunicava há
anos. Logo que chega à casa localizada na rua Aribau, Andrea se depara com a
situação do local. O caos que reina sobre sua nova moradia e sobre as pessoas
que nela habitam logo se evidenciam, deixando claro que a ajuda fornecida pelos
parentes estava mais próxima de ser um empecilho na trajetória da garota.
Com uma
narrativa em primeira pessoa, acompanhamos a vida de Andrea ser abalada pelos
mais variados tipos de pessoa. Sua família parece ser composta por um grupo de
lunáticos; alguns afetados pela idade, outros porque simplesmente agem como
loucos. Entretanto, todos parecem pensar que suas respectivas atitudes e
personalidades se encaixam em um padrão de normalidade, se comparado ao dos
outros habitantes da casa da rua Aribau. Andrea, então, descreve ao leitor os
altos e baixos de sua vida em meio a esse circo que, ora apresenta situações
cômicas, ora causa angústia diante a tantos fatos que podem ser tomados como
revoltantes ou até mesmo incompreensíveis.
Aliás, “incompreensível”
é uma palavra que parece definir bem os personagens. Nada é um livro que
trabalha em cima de seus personagens complexos. Todos possuem suas motivações e
suas desculpas para determinados comportamentos (embora nem todas tenham
parecido ser razoáveis, ao meu ver). E quando me refiro à complexidade dos
personagens, não me atenho necessariamente a um desenvolvimento que influencie
no crescimento deles e que esteja explícito ao leitor. Com exceção da própria
Andrea e, talvez, de Ena, melhor amiga da protagonista nessa história, os
outros tem seus comportamentos fixos durante o enredo. Não por qualquer tipo de
erro da autora, mas porque, ao que fica evidente, o misterioso passado de cada
uma dessas figuras foi o suficiente para os moldarem da forma que são
apresentados ao leitor. E isso é, em minha opinião, razão o suficiente para se
intrigar com cada um deles.
No âmbito
universitário, a autora procura se ater apenas à amizade de Andrea com Ena, além
de alguns outros personagens que surgem durante a leitura. Ena é o oposto de
Andrea: rica, com uma beleza mais acentuada, popular e com uma vida amorosa
mais ativa, ela pode parecer, a princípio, uma jovem fútil. Contudo, logo
nota-se que Ena é uma das figuras mais misteriosas que poderiam existir nesse
livro. E as motivações para muitas de suas atitudes – atitudes essas que fazem
nossa querida protagonista viver momentos de desgosto e preocupação – são
reveladas de maneira espetacular em um dos capítulos mais intensos de todo o
livro (ao qual eu, carinhosamente, apelidei de “A Redenção de Ena”). A
amizade de Andrea e Ena é como qualquer outra da vida real: recheada de
alegrias e tristezas, confissões e desastres, mas que nunca temina, como toda
boa amizade deve ser.
Nada é um livro agradável de se ler. Entretanto, ele é carregado de
uma atmosfera pesada. Não me refiro necessariamente a mortes, ou temas
obscuros, mas ao simples fato de Andrea levar uma vida conturbada e que por
muitas vezes parece desanimá-la. Uma vida em que nenhuma peça quer se encaixar.
Uma vida com a qual podemos constantemente nos identificar. A melancolia, a
irritação, os sentimentos amargos, tudo isso é trabalhado com maestria por
Laforet. Entretanto, isso não impede a fluidez da leitura que, aliás, é bem
fácil. O livro não é dos mais dinâmicos, mas se sustenta nos mistérios e
motivações pessoais que cercam cada personagem – todos tendo alguma influência
na vida de Andrea. Preciso ressaltar que os capítulos 19 e 21 foram, para mim,
os mais intensos e mais reveladores, pois são responsáveis por fazer com que o
leitor reflita sobre diversas coisas; pensar sobre a influência dos erros do passado,
das paixões desastrosas, das escolhas que constituem nosso caráter. Faz-nos
refletir sobre o caminho que viemos trilhando até aqui.
Nada oferece bons temas a serem debatidos; questões morais a serem
levantadas, além dos próprios enigmas que a autora nos incumbiu a desvendar. É
um livro ótimo e, arrisco dizer, um pouco paradoxal. Apesar de seu título, Nada
parece se tratar, na verdade, sobre o tudo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário