Oração



Olá, Deus.

Tudo bem com você?

Imagino que sim. As coisas aí em cima devem ser melhores do que na terra. Talvez um pouco utópicas. Ao menos é assim que eu imagino o Paraíso.

Talvez algum dia eu descubra.

Talvez não.

Então, Deus, eu já não sei como fazer isso. Já tem algum tempo desde a última vez que vim aqui. Lembro-me de sempre ter esperado os corredores e bancos da igreja esvaziarem, para, então, eu poder aparecer. Deve ser o constrangimento.

Como eu dizia: não sei mais como se faz isso de orar, ou rezar, ou qualquer termo que preferir. Acho “oração” mais agradável, pois me remete ao estudo da língua e das palavras.

Ora, Deus, não me deixe fugir do objetivo, por favor.

Novamente, há tempos que não venho aqui e me ajoelho perante a você. Não lembro nem qual a maneira correta de me dirigir a ti. Mas, se bem sei, o Senhor pode ignorar isso, certo? Acredito que seja melhor eu apenas ir falando. Dialogando. Ou monologando. Afinal, o Senhor não é de muitas palavras. Deve ser uma característica dos sábios, imagino. Contudo, eu esperava que, ao menos hoje, você pudesse me responder. Pois preciso de ajuda.

Eu sei, eu sei. As outras vezes que vim até aqui também foram a procura de abrigo. Eu tenho pedido muito e agradecido pouco. Não é justo, tenho consciência disso. Mas, veja bem, sou falho. Não tenho problemas em admitir minhas imperfeições. Dito isso, espero que eu possa continuar. O Senhor não me ignoraria, certo? Já não basta o mundo esquecer de mim. Não suportaria se você fizesse o mesmo. Minha única fonte de segurança e de esperança.

Estou triste. Desabando. Se pode ver o meu interior, já tem conhecimento disso. Eu me esforço em sorrir e tentar ser feliz como os que me cercam, mas é complicado quando não se tem muitos motivos para isso. Tudo que meus olhos enxergam é o colapso. A base do que construí para me manter longe da depressão está se tornando ruínas em meu peito; as pilastras que sustentam a integridade apresentam rachaduras que não podem ser reparadas. Esse arranha-céu que um dia eu ergui para tocar as nuvens, agora se despedaça e tomba, tijolo por tijolo. Antes eu tinha dúvidas do que estaria causando isso. Pensei que a culpa fosse de outros. Pensei que a vida conspirasse contra mim. Até mesmo considerei a possibilidade de o Senhor me detestar tanto que decidiu tomar para si o que fazia parte de mim. Porém, ao olhar para baixo, notei que um demônio grotesco e horrendo era responsável pela minha queda.

Essa criatura monstruosa era eu.

Bondoso Deus. Meus pecados são tantos que se sobressaíram. Alastraram-se pelo meu corpo, na forma de feridas e pústulas, até que me encobrissem de tal maneira que nada pudesse ser reconhecido. E, tomado por aquele desespero incompreensível, eu ocasionava a minha queda. É uma pena que meu orgulho não permitiu que eu visse isso mais cedo. Agora estou aqui. Não tenho mais a quem recorrer, pois meu ego machucou os outros que uma vez estenderam a mão para mim e me alertavam sobre meu fim. Eu os chamava de tolos e os ignorava. Hoje vejo que eu era o tolo.

Mesmo ficando sozinho, eu caminhei. Atravessei o vale da sombra da morte, sem temer mal algum, pois o mal estava em mim. Mas caminhei diante da luz, lutando para não sucumbir a essa força cruel que insistia em me fazer desanimar. Um embate sem fim que travei, sempre pensando em chegar ao fim daquele trajeto terrível. Então, eu alcancei a luz. Por causa disso, vi o quanto o mundo me manchou. Minha imagem denegrida pairava sobre a luminosidade da paz. Concluí, naquele instante, que por conta própria, eu não teria como encontrar essa mesma paz. O problema, Deus, é que afastei de mim todos aqueles que poderiam vir ao meu auxílio. Atirei pedras contra os anjos que o Senhor me enviou e deitei no chão frio da derrota. Chorei.

E depois de me sentir humilhado, decidi que minha única fonte de ajuda poderia ser o Senhor — mesmo sabendo que tentara me auxiliar em oportunidades passadas. Estou ciente de que troquei seu amor pelo amor frio do mundo. Mas não é você o salvador dos impuros? Por favor, peço que me salve.

Sei que não sou merecedor de sua misericórdia. Sei que sou um derrotado. Sei que estou morrendo.

Mas, por favor, Deus, me permita pedir mais uma coisa. Mais uma dentre os milhões de coisas que já te pedi. Posso fazer isso?

Por favor, Deus. Tenha misericórdia. Não desista de mim, ainda.

Não desista de mim.

Porque, assim como todos os outros, eu já desisti.



Amém.

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